não sei se há um desconforto, um desencontro, dois sorrisos amarelados, ou um desgosto desossado...
sei que há um amolecimento de mãos. uma ausência de pernas. um pecado encruado. um juízo morto.
um silêncio inesperado. umas palavras que não são audíveis. um parto complicado, sem nascenssa.
sei que não há um interesse recíproco. não há a impulsividade de corpos. não há uma completude de ideias. não há como fazer você me dizer. não há como eu não dizer tudo. não há o que haver. e sem haver agente não tem ar.
como eu vou fazer pra respirar?
você não está aqui pra me reanimar.
você vai me deixando morrer rápido demais...
e eu não posso mais me dar ao luxo de sair por aí sem partes de mim.
você não vai embora com meus pulmões nos bolsos.
eu demoro mas sobrevivo sozinha e logo volto a respirar.
eu não vou me perder pra você. você não quer as minhas partes partidas só os meus pulmões.
eu sou um pacote inteiro! você não pode chegar no frigorífico e pedir meus pulmões temperados. ou meu corpo desossado. ou meu cérebro fatiado. ou meu estômago habitat de borboletas.
você comprou o pacote inteiro e agora acha pesado pra levar pra casa...
- acertou.
então me diz o que você vai fazer pra que eu também faça algo. ou faz algo sem dizer pra eu poder dizer algo. ou não faz nada. não diga nada. e deixe as compras apodrecerem fora da geladeira. ou faça um churrasco de mim e deixe meu sangue escorrer entre seus dentes. ou apenas... sinta-se vivo e me deixe viver.
eu não sei.
mas vou esperar com meus pulmões dentro de mim e se você não demorar demais eu te empresto um e você nem precisa esvaziar os bolsos.
aquele abracinho